terça-feira, 12 de junho de 2012

>>> CLÁSSICOS EM ATIVIDADE

Em São Paulo, modelos da terceira idade nem pensam em aposentadoria

Não é só no filme Cars que os carros mais idosos desempenham funções normalmente designadas aos mais jovens. Na cidade de São Paulo há vários exemplos de modelos que têm alergia a ficar parados e morrem de medo de ferrugem. Podem ter saído de linha há décadas, mas não das ruas. Talvez por compensar com charme e fôlego a ausência de confortos e tecnologia dos tempos atuais, seus donos não os trocam por modelos mais recentes e mantêm suas raridades na ativa, sem a menor perspectiva de aposentadoria.


É o caso de Pedro Costa, que há 17 anos utiliza seu Ford Modelo A Phaeton 1929 para levar os clients de seu bar, na Vila Madalena, para casa. "Ofereço esse serviço ‘vip’ só para os clientes mais tradicionais e que não resistem a tomar alguns chopes ou caipirinhas a mais, ficando sem condições de dirigir seus próprios carros", diz. Como o bar nasceu há 20 anos, já com a ideia inicial de valorizar e relembrar a década de 30 em São Paulo, o modelo fica estacionado na porta do bar. "A intenção é que os frequentadores sintam-se realmente naquela época e o Fordinho ajuda a reforçar essa viagem no tempo", afirma Costa. O modelo foi escolhido pelo fato de ter sido um dos primeiros veículos disponíveis na capital paulistana e marcar o começo da indústria automotiva por aqui.

O proprietário afirma que foi o pioneiro em oferecer esse tipo de serviço. "Já disponibilizava essa comodidade aos clientes desde 1995, bem antes da publicação da Lei Seca", conta ele, que já passou por algumas saias justas nesse tempo todo. "A mulher de um cliente, quando viu o marido chegando amparado e de madrugada, jogou uma série de vasinhos no carro. Foi realmente uma surpresa inesquecível."

O cliente e amigo Joarez Silveira, que frequenta o bar desde a inauguração, é um dos que utilizam o serviço com certa frequência. "Minha esposa me deixa aqui no bar tranquila, já sabendo que vou voltar de Fordinho", afirma Silveira, que ainda se diverte em todo o caminho até sua casa. "Como ele é conversível, todo mundo interage quando passamos pelos outros bares da Vila. É como se fosse um passeio turístico", diz.


O casal Rose e Marcos Luko também não abre mão de utilizar o furgão Chevrolet Truck 1949 e uma picape da mesma marca ano 1951, conhecida entre os colecionadores como "boca de sapo", para fazer compras para seu restaurante, o Mangaba, localizado na zona oeste. "Sempre gostei de carros antigos, e ao utilizá los para o trabalho encontrei uma maneira de rodar mais tempo com eles." Tanto o furgão como a picape são usados todos os dias para ir à Ceagesp e voltar e para fazer todas as outras compras para o comércio. Rose afirma que nunca teve resistência a essa paixão do marido e considera que essa é uma boa maneira de atrair clientes. "Os frequentadores sempre fazem perguntas sobre os carros. Querem saber suas histórias e o que nos motiva a mantê-los ativos", diz ela.

Apesar da idade, os veículos não têm tratamento especial: seus proprietários não fazem cerimônia para carregá-los em sua capacidade máxima, ou seja, 1 tonelada cada um, e também ajudam a divulgar a marca de roupa que será lançada por eles. "Adesivei os dois carros com o endereço eletrônico da marca e percebo um retorno imediato na frequência do portal", afirma Luko, que se responsabiliza pela manutenção dos utilitários. "Pelo fato de ter sido metalúrgico por dez anos, adoro mexer na parte mecânica. Para mim, é uma verdadeira terapia."

O serviço sempre pode ficar mais pesado para as relíquias. O empresário Celso Pereira tem um guincho Chevrolet 1961 que é utilizado frequentemente para rebocar os carros de clientes até sua oficina mecânica, localizada na zona norte. "Comprei há sete anos porque sempre gostei de raridades, e ele acabou se tornando uma grande marca para a oficina", diz Pereira. Mesmo tendo outro guincho moderno, o comerciante afirma que alguns clientes exigem que ele vá rebocar o carro com o guincho amarelo antigo. "Mantenho o modelo sempre em perfeito estado e tenho enorme prazer em cuidar do seu funcionamento. Os carros antigos têm uma mecânica muito mais fácil de consertar."


É verdade que nem todos os velhinhos mantêm o mesmo regime de trabalho da juventude. É o caso do furgão Chevrolet 3100 1952 de Américo de Freitas, um dos donos do Sacolão Vila Sônia. Ele é utilizado pelo menos uma vez por mês para ir à Ceagesp e tem como principal função fazer propaganda do Sacolão, devidamente adesivado com os logotipos do estabelecimento. Um verdadeiro relaçõespúblicas, com muitos quilômetros rodados.

* Isadora Carvalho/Revista Quatro Rodas.

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