sexta-feira, 19 de outubro de 2012

>>> HISTÓRIA DE VIDA


Chico Gomes “congelou” uma época a bordo do Mercedes-Benz L-312

O caminhoneiro Francisco Gomes da Silva não compareceu à inauguração da BR-3. Mas, perto de fazer 18 anos, em 1957, já andava pela região com tropas. Nas cangalhas, carvão vegetal. Nascido perto, em São Gonçalo do Bação, distrito de Itabirito (MG), deixou a enxada para cair na estrada. Foi ajudante de tropeiro, engraxate em Belo Horizonte, trocador e motorista de lotação. Aprendeu a dirigir num International KB5. Logo pegou uma bicudinha (MB L-312), com carroceria Vieira (de ônibus) e a partir daí começa a história do Chico Gomes, com seu Mercedes-Benz 1957, fabricado na mesma data de conclusão do viaduto das Almas. Ele o conserva até hoje, com a cabine original.


Lá por 1970, a então proprietária do veículo, Valdemira Andrade de Melo, resolveu reconvertê-lo em caminhão, sempre com o Chico Gomes ao volante. Colocaram-lhe depois uma caçamba para tentar o serviço de minério. Não funcionou. Correu para a terraplenagem e o resultado continuou fraco. Por fim, Valdemira e Chico adotaram a carroceria aberta para carga seca e jogaram o Bicudinho na estrada. “Comecei a levar carga do Rápido 900”, explica. No entanto, os ‘ganhames’ não satisfaziam. Assim, Chico Gomes decidiu parar de viajar porque “estava casado de pouco”.

Inesperadamente, a proprietária Valdemira preferiu ofertar o L-312 para “abater na rescisão”. Dali, Chico saiu dono do primeiro caminhão, o qual mantém rodando e aprumado até hoje. Ele não esconde a vaidade quando passa e percebe que está chamando a atenção.

Guindado à condição de carreteiro, Chico Gomes correu mundo. Pegava telhas de amianto na Brasilit, em Contagem (MG), descarregava em Brasília e voltava com arroz de Anápolis (GO). Em pouco tempo virou para São Paulo, passou a carregar na Asa Branca, na Interbrasil, na Novo Mundo, na Della Volpe. Nomes que fazem parte da gloriosa história do TRC nacional. Carregava de seis a sete toneladas, para entregas em Osasco, Santo André ou São Paulo. “Naquela época tinha muita carga”, comenta. No final do governo Sarney, conseguiu pegar embarques diretos do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, de placas de gesso destinadas à modernização das agências no interior. Com frete digno, comprou mais caminhões e os colocou nas mãos de parentes. Teve um cara-chata MB LP-321 por 10 anos. Sem deixar de lado o preferido L-312. “Não vou vendê-lo nunca”, afirma.


No começo da década de 1990, ele retornou ao chamado mercado aberto. Ficou com a mineira Jamef, como agregado. Finalmente, migrou para curtas entregas de ferro-e-aço.

Chico garante que sempre teve “responsabilidade ao volante”, embora confesse que “deu muita banguela” nesses 55 anos de estrada, para poupar combustível. “No viaduto das Almas, eu descia de ponto morto por ali afora.” Diz que o movimento era fraco. O são-gonçalense envolveu-se em apenas dois acidentes ao longo dessas cinco décadas ao volante, “ambos decorrentes de falhas dos outros”, conforme relata. Em um deles, teve a perna quebrada.

Chico tem um segundo caminhão, um MB 2013. Ele alterna os dois em seu trabalho atual. No entanto, sua intenção é “parar de mexer com caminhão”, apesar de “gostar muito de viajar”. Está com 72 anos. Além disso, “o trânsito não ajuda mais”. Queixa-se que está tomando medo da estrada. A seu ver, “as passagens não estão cabendo e o sufoco diário fica cada vez maior”. Chico Gomes nunca comprou caminhão zero km, por temer o risco da dívida de longo prazo. “Sempre achei que o que vale é ter o nome limpo.”

* Redação/Revista Carga Pesada.

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