quinta-feira, 14 de agosto de 2008

>>> HERÓIS DO PASSADO

Rural: com resistência de jipe e conforto de automóvel, ela foi a precursora dos utilitários esportivos nacionais.
Quem vê a bonachona figura da Rural não imagina que sua origem está nos campos de batalha da Segunda Guerra Mundial. Ela é a versão familiar do Jeep, criado para as tropas americanas e usado em terrenos difíceis na África e na Ásia. Quando foi lançada pela Willys do Brasil, em 1956, a expressão "utilitário esportivo" ainda não fazia parte do nosso vocabulário: era caminhonete ou camioneta, mesmo. Mas ela foi uma precursora dessa tendência.

A Rural, que no início era apenas montada por aqui, é a avó dos atuais Cherokee: além das proporções de suas linhas, a posição de dirigir mais elevada e a boa altura em relação ao solo lembram os atuais Pajero e Pathfinder. Assim como nos atuais utilitários, não faltava espaço para seis passageiros (ou oito, com o uso de uma terceira fila). Porta-trecos debaixo do banco dianteiro, solução de aproveitamento de espaço difundida pela geração das minivans, ela já tinha. E era oferecida também na versão 4X4. Está certo que àquela época, quando asfalto no Brasil era quase artigo de luxo, essa opção tinha um caráter mais prático que esportivo.

Apesar de a Willys - e depois a Ford, quando assumiu o controle da Willys - focar as campanhas publicitárias nas mulheres e na família, a vocação da Rural era mesmo pegar no pesado. Mas sem exageros: sua capacidade era de 500 quilos de carga. Não chegava a ser uma vantagem competitiva, pois a Kombi carregava 1 tonelada. Mas a Rural levava em conforto e desempenho.

Chegou a hora de dirigir o carro. Confesso que esperava há anos por esse momento. Já do alto do banco do motorista, é preciso uma adaptação ao ritmo da Rural: a direção é preguiçosa nas respostas e o freio (que não é servo-assistido) parece que não vai dar conta de parar o carro de 1,5 tonelada. Mas é só tratar o pedal com alguma energia que a Rural obedece. O modelo 1970 da foto já é da fase Ford. Num primeiro contato, é preciso se acostumar com a posição das marchas na coluna de direção (a primeira para baixo e a ré para cima, apertando-se o pequeno botão na extremidade da manopla). Em pouco tempo já me senti em casa, graças também ao banco que mais parece um sofá. O metal do painel tem a mesma cor da pintura da carroceria - batizado pela fábrica de bege Panamá - e passa a impressão de solidez de uma locomotiva. E o volante, assim como os instrumentos e a alavanca de câmbio, foram emprestados do Aero Willys.

O motor, combinado com o bom escalonamento do câmbio de quatro marchas, permite arrancar com dignidade e manter velocidades em torno dos 100 km/h sem que a agulha do marcador de temperatura da água acuse algum esforço. Apesar de atingir os 130 km/h, a Rural não foi feita para acelerar. Sua estabilidade inspira cuidados com as curvas mais fechadas e os ventos laterais. Mas em velocidade de cruzeiro ela transmite segurança e a suspensão independente na frente e com molas helicoidais proporciona um rodar confortável no asfalto.

No comparativo feito por QUATRO RODAS, em julho de 1970, a Rural precisou de 25,5 segundos para fazer de 0 a 100 km/h. E quem eram seus concorrentes? A Kombi 1500, com 45,2 segundos na prova de aceleração, e o Toyota Bandeirante, que demorou uma eternidade: nada menos que 56,7 segundos.

Foram bem poucas as mudanças na Rural nacional. De 1959 até 1977, quando deixou de ser fabricada ela teve basicamente dois motores: um seis cilindros, originalmente com 90 cavalos, que foi aperfeiçoado ao longo do tempo, e um quatro cilindros, o mesmo com que a Ford equipou os últimos Maverick na década de 70.

* texto: Sérgio Berezovsky
* fotos: Marcelo Spatafora
* Revista 4 Rodas - Novembro/2001.

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